É PRECISO REPENSAR O CENÁRIO DO FUTEBOL - Meu nome é Johni

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É PRECISO REPENSAR O CENÁRIO DO FUTEBOL

É PRECISO REPENSAR O CENÁRIO DO FUTEBOL

Temos um certo hábito que considero terrível: o de isolar determinadas áreas de nosso cotidiano como se elas não fossem atravessadas por questões políticas. É relativamente comum ouvir acusações, que objetivam deslegitimar discursos, acerca de uma tentativa de politizar aspectos da vida, individual ou coletiva, que, em geral, são percebidos como não-políticos. É chover no molhado insistir que tal posicionamento só faz o jogo da ordem instituída, que visa diminuir a capilarização de um verdadeiro debate político em sociedade, reduzindo-o tão só à esfera macro e, por consequência, a um campo relativamente distante da concretude cotidiana da vida. No entanto, chover no molhado é, às vezes, um gesto necessário.
O nome de Neymar Jr. está nas manchetes dos últimos dias. E não pela qualidade do futebol jogado, tópico no qual ele sempre se destacou positivamente, mesmo quando criticado pelo excesso de simulação. Em partida contra o Olympique de Marseille pela terceira rodada da Ligue 1, campeonato francês de futebol, o jogador brasileiro foi expulso após revidar uma ofensa racista desferida pelo atleta espanhol Álvaro González, o qual se manteve impune durante a partida e, pelo menos até o instante em que escrevo esse texto, se encontra sob investigação – convém informar que a empresa responsável pela transmissão do jogo, ao ceder as imagens da partida à liga organizadora do campeonato, registrou não ter encontrado conteúdo racista nas diversas ofensas direcionadas contra Neymar Jr. Por outro lado, o canal espanhol Gol fez uma leitura labial da discussão entre o brasileiro e González, na qual observou ofensas homofóbicas feitas por Neymar ao atleta do Olympique.
O futebol, enquanto microcosmo de nosso convívio social, é também palco – seja no campo de jogo, seja entre a torcida presente no estádio – para que os diversos preconceitos, que operam enquanto forças estruturantes de nosso dia-a-dia, se apresentem e atuem. Para quem já frequentou estádios alguma vez na vida, ou mesmo já praticou algum esporte, não há novidade em dizer que a ação – da torcida ou dos jogadores – é atravessada por insultos de diversos matizes, que tornam aquele espaço tóxico, com possibilidade não pequena de agressões físicas, para corpos não aderentes a um padrão branco/cis-gênero masculino/heteronormativo. No entanto, esta vem sendo uma prática naturalizada, o que significa que ela não é percebida na medida do que efetivamente ela o é, e historicamente justificada mediante o “sangue quente” ou os “ânimos exaltados”. Nesse sentido, as práticas racistas, sexistas e constrangedoras/violadoras de corpos LGBTQI+ que acontecem em meio ao cenário do futebol têm sido longamente minoradas, como se não fossem uma amostra importante de nossas doenças enquanto sociedade, mas apenas uma pequena erupção sem maior relevância – problema esse que se intensifica uma vez que muita gente entende o futebol enquanto prática apolítica, isto é, que deve ser isenta de tensionamentos éticos.
Não se trata de politizar o futebol – o futebol, enquanto prática social, já é político. Trata-se, isso sim, de desnaturalizar estruturas de violência que vicejam com certa liberdade nos campos de futebol. Trata-se de exigir punições mais duras a atletas que promoverem insultos racistas, sexistas e/ou contra a comunidade LGBTQI+, inclusive com a possibilidade de expulsão do esporte em caso de reincidência – assim como acontece com aquelxs que são flagradxs no exame anti-doping. Trata-se de estabelecer punições severas a torcedorxs que apresentem comportamentos racistas, sexista e/ou contra a comunidade LGBTQI+, inclusive com a possibilidade de sua interdição a frequentar estádios. Trata-se de, inclusive, punir o clube com perda de pontos ou desclassificação em campeonatos se a torcida apresentar um comportamento coletivo de agressão a jogadorxs de origem étnica não branca, de sexualidade não heteronormativa e/ou a jogadoras e árbitras.
Medidas como essas forçariam uma reorganização de clubes e torcidas em prol da construção de um ambiente esportivo igualmente competitivo, mas menos tóxico. E esta é uma das grandes questões de nosso tempo. Não é mais possível relevar tais comportamentos, passar pano para situações que são claramente violentas – na verdade, nunca o foi. Não é possível ser tolerante com atos de intolerância, seja no futebol ou em qualquer outra esfera de nossa vida mais cotidiana.

A LUTA CONTINUA. JOHNI VIVE!

Imagem Internet: eSPORTE iNTERATIVO – Aurelien Meunier/PSG

16/09/2020 | Autor: Comunidade Johni Raoni 

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