ALEGRIAS - Meu nome é Johni

Meu nome é Johni
MENU
ALEGRIAS

ALEGRIAS

Hoje eu não quero falar sobre as tristezas que venho abordando nos últimos textos, nem sequer citar seus nomes. Às vezes, nós precisamos parar um segundo ou dois, desviar o corpo daquilo que nos agride e buscar algo que nos dê alguma alegria.
Só assim seguramos a barra, que não está sendo leve. Pois bem, este é o movimento aqui: quero falar de duas alegrias recentes – fatos este que me levam inclusive a fazer uma espécie de correção em um material que publiquei aqui, meses atrás.
Em novembro do ano passado, a pretexto do I Festival Literário Nacional (FLIN), escrevi e publiquei um texto intitulado “Um mesmo e velho clichê”. Nele, eu fazia a crítica do modo como, de um modo geral e respeitando as exceções de professorxs e estudantes realmente engajadxs em uma ideia de uma universidade pública organicamente integrada à sociedade, a instituições de ensino superior no Brasil se mostravam à parte do que acontecia para além de seus muros. Não tenho dúvidas de
que é possível sustentar esta mesma crítica ainda em 2020. No entanto, o fato de estarmos vivendo uma pandemia, que altera o nosso modo mecânico de repetir cotidianos, solicitando a invenção de outras formas (não necessariamente novas) de
interação, tem movimentado o cenário universitário no sentido de uma maior abertura ao público ainda alijado de um convívio mais íntimo com a formação acadêmica. E isto, que faço votos para que permaneça quando for seguro que voltemos aos espaços físicos de aula, é uma alegria.
É justo que as universidades públicas não adiram, ao menos neste estágio ainda inicial de confinamento, às aulas virtualizadas – que vem a ser a transferência do sistema presencial para um presencial nas redes, o que não se confunde com o formato ead. Fazê-lo seria deixar para trás grande parte dxs estudantes que compõe o seu quadro discente, principalmente aquelxsvinculadxs aos cursos de menor prestígio social, os quais, em geral, são ocupados por alunxsem condição de vulnerabilidade. Caso estas instituições optassem pelo modelo virtualizado, incidiriam em novos processos de exclusão daquelxs cujo acesso a um equipamento e a um espaço adequado para o estudo é difícil, complicado ou inexistente. Em um país de abismos sociais tão profundos, universidades federais e estaduais migrarem para as plataformas digitais seria assinar
uma confissão de que determinados corpos são dispensáveis ou não desejáveis, escancarando o elitismoque marca a história de tais instituições.

Por um outro lado, as universidades não estão em silêncio. A ausência de uma dinâmica presencial pelas salas e pelos corredores não implica quietude. Pelo contrário: temos visto rodas de conversa e congressos virtuais acontecendo, professorxs fazendo lives e cursos online, além de diversas formações, originalmente pagas, estarem cedendo materiais para leitura e estudo gratuitamente. Como tudo isto pressupõe acesso
irrestrito, não constituindo conteúdos exclusivos para xs já iniciadxs, abre-se uma tendência em aproximar a vida acadêmica da vida comum, modulando um vocabulário
em que estas duas esferas, noutros tempos tão apartadas, se encontrem e dialoguem.
Preciso dizer: nestes dias de pandemia e isolamento, tenho visto as universidades públicas, atualmente tão combatidas por aqueles que estão no poder, cumprirem o compromisso social ao qual efetivamente se vinculam: democratizar os saberes. Por
“democratizar os saberes” não se entende apenas impor ou oferecer ao mundo do lado de fora dos muros da academia aquilo que é produzido dentro dela, mas produzir em
parceria, em diálogo – por isso mesmo, saberes, ao invés de saber.
Em tempo: em 4 de junho, via uma plataforma de conferências online, ocorrerá a defesa de mestrado do estudante Paulo Sérgio Silva da Paz junto ao Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens da Universidade do Estado da Bahia. Tive o
prazer e a honra de ler o texto com antecedência. Intitula-se “Nóis por nóis: poesia e resistência nos saraus periféricos de Salvador”. É daqueles textos que reativam em nós a
crença na universidade: crítico, contundente, orgânico, político. Na dissertação de Paulo não existem muros entre a universidade e a vida cotidiana das periferias soteropolitanas.
Sem se reduzirem uns aos outros, estes espaços se encontram. Sucesso, Paulo. Sucesso a todxsxs estudantes, outrora abandonadx pelas universidades elitistas deste nosso país,
que falam junto contigo em sua dissertação.
Que voltemos logo à possibilidade de ocupar as salas de aula – e o “logo” significa precisamente: que tenhamos meios de controlar a pandemia e retornarmos em segurança à vida cotidiana, não que isto seja feito de maneira irresponsável e populista.
E que, uma vez que tenhamos recuperado tal possibilidade, que as universidades não se esqueçam o que têm sido nestes tempos: espaços verdadeiramente orgânicos e democráticos.

Assista, comente e deixe sugestão de novos temas.

A LUTA CONTINUA. JOHNI VIVE!

Foto Alexandre Cassiano / Agência O Globo

25/05/2020 | Autor: Comunidade Johni Raoni 

O que você achou? Deixe seu Comentário